
Para falarmos em fraternidade e para melhor abordagem do tema, utilizaremos como premissa que o ano de 1789 marcou a primeira vitória na luta pelo reconhecimento dos Direitos Humanos, quando da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, bem como marca o início promissor da Revolução Francesa, cujo tema era Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Importante destacarmos que em razão de determinados acontecimentos daquela época, os séculos seguintes foram definidos da seguinte maneira: a) XIX – Século da Liberdade; b) XX – Século da Igualdade; e c) XXI – Século da Fraternidade.
Dito isto, é possível identificarmos em cada um dos referidos períodos a aplicação prática dos princípios nascidos na Revolução Francesa, pelo que passamos a expor de forma cronológica para melhor compreensão.
Conforme mencionado, o Século XIX pode ser definido como o século da Liberdade. Ainda que a história da luta pela liberdade seja contínua e incessante, caminhando em paralelo à própria história da humanidade, foi nesse século que seu ideal se consolida, derrubando os últimos esconderijos da escravidão.
Tratava-se, primariamente, da liberdade “física” e porque não dizer a mais essencial delas, posto que todas as outras modalidades nela se apoiaram.
É dizer que liberdade tem significados muito mais amplos do que apenas a questão física, envolvendo a liberdade de pensamento, expressão, crença, consciência, informação, decisão, reunião, associação, entre tantas outras que asseguram a vida condigna da pessoa humana.
Para que o indivíduo seja de fato livre, primeiramente é necessário que seja liberto da miséria, do analfabetismo, do subemprego, da subalimentação e da submoradia. Assim, a luta pela liberdade continua não apenas para conservar as já conquistadas, mas para assegurar a verdadeira liberdade a quem ainda não a conquistou.
Já no século seguinte – Século XX –, há destaque o princípio da Igualdade. Isto porque, desde suas primeiras décadas houve movimentos pelo reconhecimento da igualdade entre homens e mulheres e entre negros e brancos.
No decorrer daquele período também houve a formação de todo o ideário contra a discriminação baseada em sexo, raça, origem, credo religioso, estado civil, condição social e orientação sexual e, da mesma forma como ocorre com a liberdade, a igualdade é um princípio que deve ser observado assiduamente, para que não haja tratamento diferenciado à determinadas pessoas simplesmente por suas características peculiares, ainda que sejam visíveis. Não há razão ou fundamento para se diferenciar o indivíduo a partir das suas características, se não há qualquer critério jurídico que justifique tal diferenciação.
Portanto, quando praticamos a verdadeira igualdade entre os seres, nos dedicamos ao respeito mútuo e sem fronteiras, jamais nos colocando em posição inferior ou superior aos demais, e sempre empenhando nossas atividades com ética e moral no mesmo plano/nível daqueles que compartilham desses ideais.
No século presente – Século XXI – levantamos a última bandeira da Revolução Francesa: a Fraternidade. Seria belo acreditar que a solidariedade norteia as ações governamentais, empresários e das pessoas em geral. Contudo, neste século o foco da proteção dos direitos deve sair do âmbito individual e dirigir-se, definitivamente, ao coletivo.
Infelizmente a sociedade contemporânea é marcada por uma série de graves problemas, entre eles os diversos níveis de alienação individual e social, as diversas crises que se abatem sobre os indivíduos e as instituições, bem como as diversas ondas de terror que, a cada dia, tornam a vida do coletivo mais ameaçada.
Em muitos aspectos, as primeiras décadas deste século foram um repetição de políticas autoritárias, do desejo de conquista e da vingança, de ideologias políticas alienadas que marcaram o final do Século XIX e a primeira metade do Século XX. Resta a dúvida se o ser humano ainda não aprendeu com todo o terror vivido no Século XX e, por isso, no Século XXI ele está repetindo, em níveis e escalas diferentes, os mesmos erros e as mesmas políticas autoritárias que marcaram negativamente toda uma época.
Ora, a Fraternidade é um nobre princípio que afirma que todo ser humano deve ser solidário e procurar compreender e ajudar o seu semelhante. Essa ajuda vai além das tarefas cotidianas, o que, mesmo sendo essencial para o desenvolvimento da sociedade, muitas vezes se apresenta apenas como meio de se obter uma contraprestação.
Certa vez o Ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal, ao proferir palestra na Universidade de Münster, na Alemanha, assim tratou do assunto:
“No início do século XXI, o conceito de liberdade e igualdade deve ser reavaliado reposicionando-se o da fraternidade. Quero com isso dizer que a fraternidade pode colocar em nossas mãos a chave com que poderemos abrir diversas portas no sentido da solução das mais importantes questões da liberdade e da igualdade com que se debate, hoje, a humanidade.”
Podemos concluir, portanto, que quando deixamos de lado o pensamento profano e com ele os vícios que cegam os homens, como, por exemplo, a vaidade, o orgulho, a inveja e a luxúria – vícios que hoje encontram-se em abundância na sociedade moderna –, e em contrapartida abrirmos os olhos diante das oportunidades que nos são expostas para praticarmos tais princípios, passamos não só a compreender, como também a conviver com o verdadeiro espírito fraternal.
É quando acolhidos entre Irmãos que aprendemos a sentir a pureza e o significado da Fraternidade, praticando esse nobre princípio todos os dias e aplicando-o às sociedades em que convivemos, com único propósito de propagar o amor fraternal que recebemos uns dos outros.
Por que a fraternidade, por si só, não poderá resolver os graves problemas e crises vividos pelo homem e pela sociedade. No entanto, precisa deixar de ser um princípio esquecido para que o mundo moderno supere a alienação, a crise e o terror que o assola, se tiver a coragem de voltar a pensar, a refletir e, acima de tudo, experimentar novamente a fraternidade.
Assim como uma engrenagem, para sermos um povo fraterno devemos caminhar ombro a ombro e sempre com a consciência de que nossos direitos apenas nos serão assegurados de fato, quando estes também forem garantidos para todos os demais.
Ir.’. Matheus Lemos dos Santos